“Enquanto uns dormem, ele treina”. Gonçalo Álvaro #Sporting @Sporting_CP #canoagem

Jornal do Sporting – sem link (Fotografia Cláudia Matos – Taça de Portugal de Velocidade)

Gonçalo Álvaro é fisioterapeuta da equipa principal de futebol e canoísta do Clube de Alvalade. Nos estágios, as horas de sono dos atletas são aproveitadas para treinar.

No último fim-de-semana de Março, Gonçalo Álvaro alcançou o 11º lugar na Taça de Portugal de Regatas em Linha, realizada no Centro de Alto Rendimento de Montemor-o-Velho.

Nada de extraordinário até acrescentarmos que já leva 37 primaveras e inúmeros treinos de preparação realizados depois das 23 horas. Porquê? Porque os cuidados físicos da equipa principal de futebol do Sporting estão em primeiro lugar para o fisioterapeuta de profissão: “Tenho de conciliar. A minha actividade profissional está sempre em primeiro lugar e só tenho de agradecer ao departamento médico pelo apoio que me tem dado, permitindo-me fazer uma das coisas que mais gosto, que é remar”.

Mais uma razão para valorizar o feito. É que nem sempre há possibilidade de marcar presença nas competições. “Participei devido à paragem do Campeonato para os compromissos das selecções. Por exemplo, o Campeonato Nacional de Pista onde participo com o Emanuel [Silva] realiza-se em Junho, um mês em que o futebol está parado, permitindo-me desde logo preparar com antecedência a competição”, explica Gonçalo, na canoagem desde 1991. “Sou de Oeiras, cresci junto ao mar e ali os jovens praticam desportos náuticos. Tinha um amigo na minha turma que fazia canoagem e convidou-me. Hoje em dia temos barcos turísticos próprios para principiantes, na altura não havia nada disso, então assim que me sentei no caiaque tombei. Pensei logo ‘nunca mais vou sair daqui enquanto não conseguir andar mais’. Fui-me desenvolvendo até parei em 2004, quando entrei no Sporting”. Era um ano de transição, por isso Gonçalo não quis arriscar e preferiu focar-se apenas na fisioterapia. “Regressei na época de 2005/2006, a competir pelo CN Milfontes”, até que em 2012, quando o Sporting contratou o Emanuel Silva, disseram-lhe para estar à vontade em convidar outro atleta para fazer parelha com ele. “O Emanuel ligou a convidar-me dizendo que poderíamos fazer umas ‘gracinhas’ a nível nacional. Não estava a acreditar nesta oportunidade. Disse-lhe que primeiro isto tinha de ser falado com a Direcção do Sporting que aceitou a ideia”, explica o canoísta que já tinha uma ligação antiga com o atleta bracarense. “Sempre me dei bem com ele, as vezes até me ligava para lhe dar conselhos físicos antes de vir para Alvalade”, conta.

Quando não é possível participar lamenta, quando acontece o inverso prepara-se. Adoptando a conhecida frase, “quem corre por gosto não cansa”, Gonçalo Álvaro explica os contratempos que a profissão traz à preparação, nomeadamente os estágios da equipa de futebol. “Treino quando for preciso. Às dez da manhã ou às 11 da noite. Faço musculação, nado, remo, ando de bicicleta… O treinador José Sousa envia-me o micro-ciclo e ajusta-o ao tempo disponível. Por exemplo, quando vamos para as competições europeias, costumo correr ou ir ao ginásio quando os jogadores dormem a sesta ou após o recolher obrigatório, treinando até à meia-noite, aproximadamente. Treino, em média, nove a dez vezes por semana. É a única maneira de competir com atletas mais novos. Falta de tempo! Todos temos tempo, pode é não haver vontade. É preciso ter atitude e motivação o que, desde a vida do Emanuel, subiu. ‘Tenho mais responsabilidade agora’”, avança.

Mas do futebol não chegam só vicissitudes. Para além de dar a conhecer a modalidade aos futebolistas “leoninos” nos últimos 11 anos, eles próprios servem de motivação. “Nunca os convidei para remar. Mas não deixa de ser curioso o interesse deles nos meus resultados e se tenho treinado ou não. Quando não faço boas marcas gozam comigo, dizem-me ‘então, estás velho! Estás cansado! Rebenta com os miúdos, tu és uma máquina!’ É uma forma de me motivarem também,”, lembra em tom de brincadeira.

FUTUROS CANOÍSTAS EM CASA

Gonçalo Álvaro tem dois filhos, mas ainda são muito novos para seguir as passadas desportivas do pai. “Têm dois e seis anos de idade. O mais velho joga futebol nas escolinhas do Sporting. Adora futebol, é fanático. Para a canoagem são muito novos, ainda que o mais velho já tenha andado comigo no barco. Talvez com dez ou 11 anos o façam. Eu próprio comecei apenas com 14 anos. Tenho quase a certeza que vai acontecer, porque estão habituados a ver-me”, explica. Se o fizerem, já há dicas guardadas quanto aos melhores sítios para remar. “O sítio favorito, em termos de preparação, é Montemor-o-Velho, porque é lá que fazemos provas. Em termos estéticos, temos vários sítios lindíssimos. Costumo ir uma semana para Vila Nova de Milfontes, na altura das férias do futebol. Tem a barragem do Morgavel muito perto e o rio Mira também”.

Jogar em casa – A opinião de Mário Santos

Jornal A Bola, 3/04/2015 – sem link – (Foto dos 5000 metros no Campeonato da Europa de Velocidade 2013, no CAR de Montemor-o-Velho)

Recentemente, a Federação Internacional de Canoagem (ICF) atribuiu a Portugal a organização de mais uma Taça do Mundo, em 2017 em Montemor-o-Velho. Mais um resultado da estratégia da Federação Portuguesa de Canoagem (FPC) em trazer para o país importantes competições internacionais. Este ano, Portugal acolhe a Taça do Mundo e o Campeonato do Mundo de Juniores e sub 23.

Os eventos em território nacional podiam e deviam servir para permitir aos nossos atletas competir incentivados pelo ‘fator casa’, dar visibilidade às modalidades no seio do desporto luso e inspirar novos praticantes.

A título de exemplo, refira-se que nessa mesma reunião da ICF esteve em discussão a candidatura à realização do Campeonato do Mundo de velocidade de 2019, que servirá de qualificação para os Jogos Olímpicos de Tóquio 2020. Os candidatos foram Duisburgo, na Alemanha e Szeged, na Hungria. Duas pistas emblemáticas na canoagem e que nos dias de competição transbordam de adeptos, chegando a ultrapassar os 50.000.

Outro exemplo vem de Inglaterra ao lançar a campanha “EveryRoadtoRio”, que pretende aumentar o número de atletas para os Jogos Olímpicos Rio 2016. Nos próximos 18 meses e, na sequência de uma estratégia há muito delineada, vai organizar 30 grandes eventos desportivos, com 13 Campeonatos do Mundo e da Europa, nos quais se discutirão 95 lugares de qualificação olímpica. Além de um significativo retorno financeiro esperam que o apoio do público leve os seus atletas a superarem-se e a fazer melhores resultados, recriando o ambiente de Londres 2012.

Em Portugal estes eventos internacionais ocorrem em recintos maioritariamente vazios. Um país que não assiste os seus atletas a competir em casa, não é mais ou menos patriótico, apenas não valoriza e não aprecia o desporto. Isto apesar de muitos dos ausentes nesses eventos se indignarem publica e hipocritamente pela “falta de apoio às modalidades”.

Mário SantosPresidente FPC 2004-2013 e chefe de missão JO Londres’2012